Brasão de dom Antônio Fernando Saburido

“Eis o dia que o Senhor fez, seja para nós dia de alegria e vitória” (Sl 118).

 Queridos irmãos e irmãs,

“Para ti as trevas não são trevas e a noite se faz clara como o dia”. Esta palavra do salmo 139 é retomada pela Igreja latina no anúncio da Páscoa (Exsultet) e aparece em muitos poemas litúrgicos orientais para louvar a noite de vigília que Santo Agostinho chamava de “mãe de todas as vigílias da Igreja”. Hoje, podemos pensar que ela não é somente a mãe das vigílias cristãs, mas é também resumo e expressão de todas as vigílias da humanidade, desde a noite que uma mãe passa acordada a cuidar do filhinho com febre até os tantos empregos que exigem dos profissionais passarem a noite acordados para ganhar o sustento para suas vidas. Até mesmo jovens e adultos que avançam madrugada adentro, em sadio lazer e descontração, no mais profundo do coração, buscam uma notícia alegre que dê sentido a um novo dia. Para nós, cristãos, essa boa nova dada por Deus é a Páscoa. Ela diz à nossa fé que Jesus ressuscitou e que nos chama a ressuscitar com ele, desde agora, através de uma forma nova de viver.

Assim, podemos celebrar essa Páscoa como algo que acontece não somente a Jesus, mas a nós todos/as. Recebemos de Deus essa oferta: a ressurreição aqui e agora não apenas no sentido da imortalidade da alma, mas de nos converter e nos transformar em pessoas de comunhão e testemunhas fiéis do projeto divino no mundo, o reino de Deus. Em todas as tradições religiosas, a espiritualidade consiste nas pessoas se tornarem capazes de superar toda forma de egocentrismo e de fechamentos em sua própria cultura e visão do mundo e se tornarem irmãos e irmãs universais, como testemunhas do Espírito divino que “abarca toda criatura e preenche todo o universo” (Cf. Sb 1, 7). Só assim poderemos dizer como São Paulo: “Já não sou eu que vivo. É o Cristo que vive em mim” (Gl 2, 20).

Na proximidade dessa Páscoa, a Igreja Católica recebeu um novo papa. Para nós é significativo não tanto o fato dele ser latino-americano, mas de ter querido se chamar Francisco, de ter se apresentado ao mundo, em primeiro lugar, como bispo de Roma e de frequentemente insistir no cuidado com os pobres e pequeninos, preferidos de Deus. A nossa Igreja de Olinda e Recife tem uma história e uma responsabilidade com relação a isso. Que Deus a torne cada vez mais uma Igreja pascal, isso é, não fechada em si mesma, não restrita a seus ritos e costumes, mas peregrina e livre, sempre capaz de evoluir, de dialogar com as pessoas do mundo de hoje, como espaço de comunhão para todos os irmãos e irmãs da humanidade. Assim, ela poderá ser testemunha das “coisas que os olhos não viram, nem ouvidos ouviram, nem penetraram no coração humano e constituem o que Deus preparou para as pessoas que o amam” (1 Cor 2, 9).

Considero evento pascal o seminário sobre “convivência com o semiárido”, que tivemos a graça de promover recentemente, em parceria com a Federação dos Trabalhadores na Agricultura de Pernambuco (Fetape) e Cáritas regional.  O auditório, cedido pela Universidade Católica de Pernambuco (Unicap), ficou pequeno para a realização da terceira etapa da campanha “Tem gente com sede de solidariedade”. As diretrizes propostas e entregues aos representantes do governo federal e estadual, frutos de longa reflexão de pessoas ligadas à Igreja e às várias organizações sociais, representam sinais de esperança para nossos irmãos/ãs que sofrem as consequências da estiagem prolongada, nas regiões do sertão e do agreste nordestino.

Nessas celebrações pascais, na Missa do Crisma da 5ª feira santa, renovarei com o clero e com todos os/as agentes de Pastoral e colaboradores/as da nossa missão pascal, o compromisso de viver pessoalmente isso que pregamos e de testemunhar que Jesus ressuscitou não só por nossas palavras, mas por uma forma de agir amorosa, dialogante e aberta para tudo o que “o Espírito diz hoje às Igrejas” (Ap 2, 5).

Feliz Páscoa para todos/as! Deus os/as abençoe!

 

Dom Antônio Fernando Saburido, OSB
Arcebispo de Olinda e Recife