
ARQUIDIOCESE DE OLINDA E RECIFE
MISSA DO CRISMA – 2021
Amados irmãos e irmãs:
Ninguém de nós imaginaria que, após mais de um ano de pandemia e de sofrimentos de todo tipo, para cada um de nós, e para todo o nosso povo, ainda tenhamos que celebrar este Tríduo Pascal, tendo diante dos olhos, muito mais o mistério da cruz e da morte do que os sinais de ressurreição e vida que a Páscoa nos anuncia.
Por mais contraditório que pareça esta Missa do Crisma, em que somos obrigados a cumprir restrições, com a presença física, apenas de representantes do clero, dos religiosos e dos fiéis, seja vista como sinal de amor e respeito à vida. Ela vem nos convocar a nos manter de pé, em atitude de vigilância amorosa e confiante espera. Desde já, queremos nos solidarizar com todos e todas que perderam seus entes queridos, sobretudo as vítimas da Covid-19.
Da quarentena em que me encontrava, em março do ano passado, citando Isaías 21,11-12 escrevia em mensagem para o nosso povo: “Sentinela, em que ponto está a noite? Esse questionamento do profeta continua. Passados mais de um ano, ninguém tem ainda a resposta. Nestes tempos de pandemia, as noites de tormento dos doentes, seus familiares e também dos profissionais da saúde, trabalhando em situações de risco, assegura aos irmãos e irmãs enfermos o mínimo de conforto e segurança. É doloroso saber que a cada dia no Brasil, aumenta assustadoramente o número de pessoas que estão morrendo pela crueldade do vírus, mas também pela insensatez de uma parte da sociedade e de autoridades que persistem em negar a realidade. Em meio a tudo isso, podemos sempre vislumbrar as ações de solidariedade e os gestos de esperança e comunhão. São sinais que nos indicam que podemos fazer da noite, mesmo da noite mais escura, uma luminosa vigília de Páscoa.
O evangelista Lucas que acabamos de ouvir, citando o cap. 61 de Isaías, nos recorda o início da missão de Jesus que, na sinagoga de Nazaré, sua terra, afirma: “O Espírito do Senhor está sobre mim, porque ele me consagrou com a unção para anunciar a Boa-nova aos pobres; enviou-me para proclamar a libertação dos cativos e aos cegos a recuperação da vista; para libertar os oprimidos e para proclamar o ano da graça do Senhor”. Jesus se identifica com as palavras do profeta Isaías e as assume como seu projeto messiânico. O programa de Jesus prevê a libertação dos marginalizados, sua plena reintegração na sociedade, com a recuperação plena de tudo aquilo de que foram expropriados. A Boa Nova de Jesus consiste numa prática que leve as pessoas marginalizadas à posse da vida plena.
O projeto libertador do Mestre deve modelar o programa de vida dos discípulos. Todavia, não conseguiremos tornar nosso este caminho, se abrirmos mão do nosso compromisso com as obras do alto, dando espaço para as limitadas propostas que o mundo nos oferece. Na condição de diáconos, presbíteros e bispos, como escolhidos e enviados para colaborar, mais intimamente, com a missão de Jesus, devemos estar sempre dispostos a renovar nosso propósito de modelar nossa vida a partir da Palavra e do Testemunho d’Aquele que nos chamou e que segue à nossa frente, apontando-nos o rumo a seguir.
O texto do Apocalipse recorda-nos que Deus fez de nós um reino, sacerdotes para seu Deus e Pai. A comunidade cristã é a força positiva que, junto com o Cordeiro, vence os poderes opressores que se instalam na história. Ele fez de nós sacerdotes para Deus, seu Pai. Por meio do Batismo, os cristãos participam do único sacerdócio de Cristo, que consiste em instaurar o Reino de Deus na história. Não importa os nossos limites e infidelidades, importa sim, a disposição de nos levantarmos e recomeçar, contando com a força de Deus.
Que nosso SIM às respostas da renovação das promessas sacerdotais que faremos logo mais não seja vazio, mas parta do mais íntimo dos nossos corações e nos recorde o momento solene em que, na ordenação, fomos questionados pelo bispo e respondemos, com convicção e alegria, prometo. É sempre oportuno recordar o que prometemos, solenemente, naquela ocasião memorável: ”desempenhar sempre a missão de sacerdotes como fieis colaboradores da ordem episcopal, apascentando o rebanho do Senhor, sob a direção do Espírito Santo; exercer o ministério da palavra proclamando o evangelho e ensinando a fé católica; celebrar com devoção e fidelidade o ministério de Cristo, sobretudo o Sacrifício Eucarístico; ser fieis à oração, especialmente à Liturgia das Horas, em comunhão com toda a Igreja; unir-nos cada vez mais ao Cristo, que se entregou ao Pai por nós; e, finalmente, respeito e obediência ao bispo diocesano e seus sucessores”. Em tempo tão difícil como o que atravessamos, somos chamados a viver essa experiência na dor e na solidariedade, sem perder a esperança. Neste dia em que Jesus Cristo instituiu a Santa Eucaristia e o Sacerdócio Ministerial, agradeçamos a Deus pela nossa escolha apesar das tantas infidelidades, e renovemos o nosso propósito de seguir sempre os passos do Bom Pastor.
Todo o planeta, especialmente o nosso país, protagonista mundial nos casos de contaminações e mortes, está mergulhado em uma crise sem precedente, acarretando: desemprego, subemprego, violência, fome, enfermidade física e psicológica. Assim sendo, somos desafiados a sermos padres e diáconos servidores e profetas. Capazes de animar e consolar o nosso povo para que ninguém se entristeça demasiadamente e perca a confiança em Deus. Vivemos uma prolongada crise ética, econômica e política. Enfim, uma crise social e religiosa que traz sofrimento e demasiada perturbação para nossa gente. O povo brasileiro continua extremamente dividido e ainda se percebe uma onda de intolerância e dificuldade de diálogo. Nós, ministros de Deus, precisamos ajudar nesse campo, não somente pelo testemunho de unidade, mas colaborando por restabelecer um clima de fraternidade e paz.
O conceito de sacerdócio implica o de consagração, cujo sinal exterior é a unção com o óleo santo. Por isso, a Igreja continua a consagrar o óleo que servirá para assinalar a fronte dos seus filhos e filhas. Conforme a tradição, nesta Missa, consagraremos o Santo Crisma para significar o dom do Espírito Santo no Batismo, na Confirmação e na Ordem. Abençoaremos também o óleo para os Catecúmenos e os Enfermos, sinais da força que liberta do mal e sustenta na provação da doença. Estes santos óleos, distribuídos para todas as nossas paróquias e comunidades, utilizados até a Páscoa do próximo ano, seja apresentado à comunidade paroquial na Celebração da Ceia do Senhor, como sinal de unidade e fonte de bênçãos, para todos os que com eles forem ungidos.
Participemos agora com atenção e piedade do rito de renovação das promessas sacerdotais, a que nos referimos acima. Com semelhante propósito junte-se espiritualmente a nós todos os nossos irmãos presbíteros, diocesanos e religiosos, que estão sintonizados conosco através das redes sociais e assim expressemos o nosso propósito de unidade e disposição para continuar firmes na missão. Sintam-se todos aqui presentes, representados pelo nosso Conselho Presbiteral e demais presbíteros.
Desde já, desejo a todos os bispos, padres, diáconos, religiosos/as, consagrados/as, seminaristas, leigos/as, frutuosas celebrações pascais, em suas respectivas paróquias e comunidades, presencialmente ou online. Celebrações estas que terão como ponto culminante a proclamação da Páscoa do Senhor. Que a Ressurreição de Jesus, Sua vitória sobre a morte, nos sirva de sinal de esperança, na certeza de que dias melhores virão e, logo mais, essa pandemia passará para a história.
Amém!
Dom Antônio Fernando Saburido, OSB
Arcebispo Metropolitano